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terça-feira, 11 de outubro de 2022

Entrevista | Osvaldo Carvalho (FTT) o super ciclista que já leva 25 mil km este ano

POR: JOÃO CARLOS LOPES | FOTOS: DR

"Já passei por situações que até o diabo se assustava”

Osvaldo Carvalho é um ciclista muito ativo que encontrou na modalidade, há 11 anos atrás, um motivo para deixar de fumar, trocando, nessa altura, os desportos coletivos, entre eles o futebol, onde era muito competitivo, por um individual, onde dependesse apenas do seu esforço e mentalidade. Entretanto, depois de representar a equipa dos Roladores de Basto, onde se iniciou no ciclismo, juntou-se à grande família do Fafe Talho Team da qual é o maior embaixador, levando o equipamento da vaquinha sorridente a percorrer muitas das estradas do país, onde se sente à vontade para pedalar em qualquer tipo de terreno. Aos 45 anos, este polícia municipal, natural de Outeiro, Cabeceiras de Basto, é já uma referência nacional de resiliência e dedicação a uma modalidade que cada vez tem mais praticantes no nosso país. A sua última grande aventura foi fazer o trajeto Cabeceiras de Basto - Santiago de Compostela Fátima - Peniche “NonStop”, num total de 800 km. Mentalmente forte e amigo do amigo gosta de honrar os seus compromissos e cumprir as suas promessas. O ano ainda não terminou e já leva 25.000 quilómetros nas pernas e a vontade de pedalar continua insaciável. 


Qual é a sua relação com o desporto?

Sempre pratiquei futebol e por vezes atletismo, mas adoro todos os tipos de desportos e competições.

Como descobriu o ciclismo?

O ciclismo descobri por acaso, como sou muito competitivo e levo todos os desportos a sério e como no futebol, por vezes, ia-me chateando porque não ninguém se esforçava como eu, pois se fosse para dormir não saía de casa, chegou a uma altura que decidi praticar um desporto que não fosse coletivo para acabar com as chatices e o stress do futebol, vi na bicicleta uma boa possibilidade de praticar verdadeiramente desporto.

Como é que a sua mãe entra no seu ingresso no ciclismo?

Há cerca de 11 anos fiz uma proposta á minha mãe: se ela me oferecesse uma bicicleta eu deixava de fumar. O que ela prontamente aceitou e logo no dia seguinte fui à loja escolher a bicicleta que queria e comunicar-lhe o seu custo. Começou aí o meu relacionamento mais sério nas lides do ciclismo, mas ainda mais importante para mim foi cumprir a promessa e não dececionar a minha mãe, e também não menos importante lutar pela saúde física e mental.

Porque faz tantos quilómetros em cima da bicicleta?

Faço muitos quilómetros principalmente por prazer, mas cheguei a uma altura que também já sinto necessidade de fazer 3 ou 4 horas diárias e esse patamar não é fácil de manter. Procuro nunca sair dessa linha e ter sempre motivação para continuar a superar-me acima de tudo. Com essa mentalidade já levo este ano cerca de 25 mil quilómetros. 

Como projeta as suas voltas?

Não olho a médias nem a conquistas, só tento começar a volta idealizada e chegar o mais rápido a casa para descansar e tratar das outras tarefas obrigatórias, que como imaginam são como as de todo o mundo, só tenho o tempo bem estipulado e sigo o tudo à risca de forma organizada.

E aquelas em que faz distâncias fora do normal? 

Nunca início as voltas de grande distância se não tiver a certeza que as termino e preparo-me bem para essas aventuras. Podem acontecer imprevistos que me obriguem a abortar a iniciativa ou a impedir-me de concluí-la, mas isso já são situações que me ultrapassam e que não consigo dominar.

Tento sempre decorar o percurso e nunca levo nenhum “track” no GPS nem no telemóvel porque gasta imensa bateria e obrigatoriamente faz-nos estar sempre a olhar para lá e deixar de apreciar o percurso e as paisagens, sinto me mais livre e despreocupado assim por incrível que pareça.

O que lhe dá prazer em cima da bicicleta?

O que me dá prazer é mesmo pedalar, não escolho os percursos por serem mais ou menos difíceis, porque até quando mais subimos menos vai custando faze-lo. Consigo fazer tudo e cada vez mais sinto que me consigo manter durante horas e horas ao mesmo ritmo, seja a subir ou em plano. A descer só é necessária técnica e não ter medo, de resto como como diz o povo "a descer todos os santos ajudam".

É perigoso e arriscado andar nas estradas portuguesas?

Considero sim, que é um risco muito grande, porque não existe leis, nem quem as aplique e por isso é uma selva em que cada um faz o que quer e eu já passei por situações que até o diabo se assustava. Contudo, tenho algumas técnicas que tento por em prática para me proteger e até hoje, felizmente, que tem funcionado.

Como consegue fazer tantos quilómetros seguidos?

Existem formas que eu utilizo para ultrapassar essas maratonas e dou um exemplo: se estiver a pensar fazer 800km, quando chegar aos 100km começo a mentalizar-me que ⅛ está feito só faltam 7, Quando chegar aos 200km só faltam 6x100, por exemplo quando chegar aos 400km já está metade e a partir daí é sempre a diminuir as vezes.

Se pensarmos que após cada quilómetro que fazemos menos faltam para o final do nosso objetivo é isso que temos que utilizar como positivo, no meu caso funciona e até acaba por me distrair do sofrimento e das dificuldades que possa sentir. De resto nunca devemos desistir e acreditar que é sempre possível fazê-lo. Isso é o mais importante, a partir daí é muito treino e acima de tudo ser forte mentalmente.

A sua última aventura, Cabeceiras de Basto – Santiago de Compostela – Fátima - Peniche, tudo seguido (800 km) dava para percorrer Portugal de lés-a-lés. Já tinha feito algo parecido? 

Por falar em atravessar o país de lés-a-lés já o tinha feito em 29 de julho de 2017, com os meus colegas de equipa dos Roladores de Basto, com os quais me iniciei no ciclismo. Tenho feito trajetos de várias centenas de quilómetros como ir de Cabeceiras de Basto a Peniche e vice-versa, entre outras aventuras nas quais me supero, mas acima de tudo, ganho muitas histórias e amizades para toda a vida. 

Qual é a sua ligação a Peniche? 

A minha ligação a Peniche é simplesmente por ter casa durante todo ano à disposição e desde já agradeço às pessoas em causa a amabilidade de fazerem gosto que seja a minha segunda casa. De facto quando lá estou sinto-me verdadeiramente como em minha casa.

Como ingressou na equipa do Fafe Talho Team?

Entrei para a equipa depois de falar com o presidente Paulo Soares. Já éramos amigos nas redes sociais e já nos tínhamos encontrado na estrada várias vezes e a equipa chamou-me atenção. Um dia perguntei-lhe se era possível fazer parte da equipa ao qual me respondeu que tinha todo o prazer e assim foi, a partir daí tenho ficado encantado com tanta simpatia trabalho e dedicação ao ciclismo e às pessoas que fazem parte da família Fafe Talho. O presidente é incansável e o primeiro a dar o exemplo com uma coordenação que é espetacular. Nós só precisamos das pernas e da vontade, o resto o empenho e a vontade dele tratam de tudo. 

Como se alimenta um ciclista que faz tantos quilómetros? 

Quanto à alimentação nem sempre faço a melhor, principalmente sinto falta nas maratonas e ultra maratonas que quase não paro para comer nem beber.

Não sou muito apologista de géis, nem barras energéticas, sinto que ajuda naquelas partes em que o corpo está fraco e como não paro é muito importante, mas passadas uma ou duas horas fico na mesma e essas coisas acabam por me enjoar e deixar-me desconfortável, por isso quase não uso.


Nesta altura do ano e na primavera em que as temperaturas estão amenas nas voltas de 3, 4 e até 5 horas, não sinto necessidade de comer ou beber, porque só ando depois de um excelente pequeno-almoço ou do almoço e isso é suficiente para fazer os treinos sem comer ou beber.

Sei que não é o ideal mas é assim que eu me sinto bem, faço uma boa alimentação antes e após os treinos, para recarregar as baterias para o resto do dia ou para o dia seguinte.

Algum sonho por cumprir como ciclista?

Adorava poder fazer o trajeto desde a nascente do rio Douro até ao Porto, não é bem um sonho nem algo de importante para concretizar só mais uma ultra mega maratona.

Como sonho gostava de participar em provas de estrada de grandes distâncias mas para isso é necessário ter um grande suporte financeiro e perder algum tempo na pesquisa desses eventos e ainda estar por dentro do assunto, o que não é bem o meu caso que tenho outras prioridades para me poder dedicar simplesmente a pedalar. Se tivesse um agente a tratar desses assuntos, isso sim seria o concretizar de um grande sonho.

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